Entre os riffs hipnóticos estilo Sabbath de Kim Thayil e os altos gritos, estilo tenor Robert Plant de Chris Cornell, Soundgraden é geralmente descrito pelos fãs de alternativo como apenas uma banda de metal um pouco mais esperta do que a média. Afinal, o quanto estava lá em "Rusty Cage" ou "Outshined" além de uma atualização sombria, suja e adaptada bem Zepplinesca?
Um bom tanto, na verdade. Mas tem sido fácil não perceber os aspectos mais complexos do Soundgarden no estardalhaço de seu ataque instrumental pesado. Como resultado, "Superunknown" veio como um choque para muitas pessoas, e não apenas porque oferece mais do que guitarras pesadas e vocais heróicos. Por toda a excitação aural providenciada pela psicodelia surfista de "My Wave" ou a baladeira a la Beatles de "Black Hole Sun", os verdadeiros pontos altos do album estão mais relacionados com o conteúdo emocional do que com os floreamentos estilísticos. No seu melhor, "Superunknown" oferece uma descrição mais precisa de alienação e desespero do que qualquer coisa em "In Utero".
Pegue "Mailman", por exemplo. Em um primeiro momento, parece ser mais um número sociopata, com Cornell gemendo linhas como "I'm the dirt beneath your feet/The most important fool you forgot to see" enquanto guitarras zumbindo repetem ao mesmo tempo a melodia por trás. Mas ao invés de ir para um final esperado, a canção foca-se na ameaça incipiente dos tratos e promessas do protagonista, um artifício feito bastante desconcertante pelo obscuro sexual implícito que Cornell manda no refrão: "I know I'm headed for the bottom/But I'm riding you all the way." É uma performance genuinamente assustadora, em grande parte porque não oferece ao ouvinte algum aviso prévio. Pelo final da música, ainda estamos presos em seu vortex de malícia e intimidação.
O Soundgarden parece glorificar-se nessa forma de método-atuação nas composições, aceitando facilmente as contradições dentro da visão de cada personagem. Veja como facilmente "My Wave" move-se de sentimentos libertários dos primeiros versos para uma territorialidade agressiva em "keep it off my wave" do refrão, apresentando uma visão de que fazer suas próprias coisas é legal mas desde que seja em qualquer outro lugar. Ainda ao invés de apontar a falácia no pesnamento do protagonista, a música o apoia, trocando entre uma síncope gaga e martelada nos versos para um quase sublime e psicodélico groove no refrão. Este, em outras palavras, é o mundo visto pelo surfista. Qualquer tentativa de impor alguma moral sobre isso fica a cargo inteiramente do ouvinte.
Nas mãos de bandas mais fracas, essa abordagem poderia facilmente tornar-se uma fuga estética, parecido como alguns gangsta rappers tentam desculpar o banditismo de suas letras chamando de "realidade das ruas". Mas o Soundgarden não estava interessado em fazer julgamentos morais tanto quanto a convir o senso desses sentimentos ao tocar nessas canções, sejam eles tão simples quanto a quase idiótica benção simplística que borbulha através dos ritmos infecciosos de "Spoonman" ou tão complexas e cansativas como o desespero degradante descrito nas cadências tristonhas de "Fell on Black Days". E mais do que qualquer coisa, essa habilidade de evocar a vida emocional por entre essas melodias que mantiveram o grupo de fora dos que só foram mais um ato de guitarras pesadas.
Não que houvesse algo especialmente cliché sobre o som de "Superunknown". Entretanto a banda serve uma boa quantidade de petardos metálicos, da guiada pela bateria remexida e de toque seco de "Let Me Drown" à lenta e arrastada de "Limo Wreck", Soundgarden recusa-se a se definir em restritos termos headbangers. Então ao invés de fazer a usual conexão entre o metal e o pesado, a banda gira seu som em todas direções inesperadas, enchendo "4th of July" com estilhaços suficientes e riffs 4/4 quadrados para preencher a lacuna entre Live Skull e Black Sabbath, e evocando tudo desde Captain Beefheart até Nirvana e Cream dentro de um espaço minísculo em "Head Down".
Para ser honesto, entretanto, esse aventurismo da banda nem sempre funciona a seu favor aqui. Com sua apaixonada, a la Lennon molhada, guitarras Harrisonianas, "Black Hole Sun" é um maravilhoso exercício da herança Beatles. O problema é, ela não é uma boa canção, oferecendo mais no sentido de estado de espírito e atmosfera do que na direção melódica. Quanto às vezes do baixista Ben Shepherd, a discordante "Half" (que ele compôs), basta dizer que essa música é a virtual definição de um lado B.
No todo, podemos pensar, que "Superunknown" não somente acerta mais do que erra, mas demonstra mais alcance do que muitas bandas poderiam conseguir em todas suas carreiras. Mesmo que tenha colocado a banda na linha de frente do rock alternativo, depois da onda grunge tudo voltou naturalmente para seu devido lugar. Fica aqui a lembrança para quem gosta.
Bunch of classics in this one.
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