Detroit no começo dos anos 70 era largamente populada por música selvagem e vivaz de todos os tipos: o maluco, funk psicodélico da turma de George Clinton, o rock raivoso de MC5, Stooges, Frost, SRC, Bob Seger pronto para estourar com tudo, toda a cena da Motown, Grand Funk Railroad batendo no topo das paradas, etc. Isso tudo acontecia em vários lugares ao vivo e em cores. Música era um dos únicos lugares em Motor City onde as noções de raça e classes tornaram-se virtualmente invisíveis. E as estações de rádio de Detroit, mesmo que em horários alternativos, apoiavam bastante a cena local. A influência que todas essas bandas tiveram na cena local foi tremenda, como foi a influência de Alice Cooper, que começou fazendo música na cidade antes de emplacar nas paradas e mudar-se para Los Angeles depois.
Entram em cena os Hackney Brothers: o guitarrista David, baixista Bobby e o baterista Dannis (vulgo Death). Esses três irmãos já haviam praticado em várias unidades de funk e soul até mais ou menos 1973 quando começaram a curtir os sons mais pesados da época, particularmente os Stooges e Alice Cooper. Eles adotaram seu quase macabro pseudônimo e começaram a tocar em muitas festas e shows de garagem e os ocasionais bailes sarais ALSAC Teen nos domingos à tarde. Em 1973 gavaram uma demo que davam nos shows que começaram a ser a última palavra nas bocas mais antenadas. Eles entragaram nas mãos do produtor Don Davis, que lhes trouxe para a United Sound e fez os singles que depois se tornaram, graças a Drag City, "For the Whole World to See", que finalmente se viu lançado após 35 anos na lata! O som aqui é direto uma boa pancada de garage rock na tradição da grande Detroit. As canções são belamente escritas, cruas mas bem feitas, ritmicamente empolgantes, impregnadas de guitarras e sem muito feedback porém focadas. Confira as faixas mais conhecidas da banda como "Where Do We Go from Here?" e a hiper política "Politicians in My Eyes". Aqui um barulho de baixo ultra-sônico, bumbos galopantes e ataques de pratos fundem-se com grandes pedaços de um massacre de seis cordas. Isso é proto-punk no seu melhor. Ponto final. Cadências alternadas encontram power chords distorcidos e riffs escorregadios com a energia primitiva movida a testosterona que o melhor do rock & roll de Detroit trouxe à tona: frustração, raiva, hedonismo, e uma atitude de "tacar o foda-se". A abrupta mudança no retorno e na distorção no final de "Politicians..." são iguais a tudo que veio na época. Adicione a isso o quente hino de festa "Keep on Knocking", a insana "Rock N´ Roll Victim", e a pancada de guitarra Hendrixoniana de "You´re a Prisioner" e você vai acabar balançando a cabeça de surpresa e até amiração. A música em "For the Whole World to See" não é uma coleção de partes juntadas para faturar uma grana. Em uma era em que albuns "perdidos" e "clássicos" parecem ter vindo de cada selo do planeta, os meros 26 minutos e meio de som gravado do Death tornam-se um capítulo à parte na história secreta do rock. Sim, é verdade que colecionadores malucos fanáticos andaram pagando fortunas pelos singles originais, mas é a música que importa. Este incrível album é mais uma evidência da história secreta da música de Detroit. Fãs de Bad Brains, Hendrix, Iggy e Stooges, tomem nota. A palavra "clássico" neste sentido não é apenas precisa, é inegável.
For the whole world to hear.